domingo, 11 de novembro de 2018

       Uma mulher que vale a pena

Todo mundo é curioso, pode ser pela vida alheia, pelo conhecimento ou mesmo pelo outro. Mas a minha curiosidade é pelo ser humano. Tanto que quando saio de casa, fico com antena ligada em tudo. E isto é uma técnica que uso para me aprimorar como jornalista. E isto está dando muto certo. E agradeço à Deus, diariamente por isso. Pois à cada dia, conheço mulheres mais formidáveis que ontem ou mesmo do mesmo quilate.
  E foi isto que aconteceu. Estava andando, fazendo exercício na Praia de Pitangueiras, quando vi uma senhora muito bonita, com faixas com dizeres, que precisamos melhorar o país e que cada um pode fazer. Fiquei muito curiosa e ela muito educada,e bonita me explicou que haviam candidato que pretendiam com sua campanha e objetivos melhorar o país. Mas, apesar disso, pois não gosto deste assunto, prefiro ajudar as pessoas, independe de partido...
 E por isso perguntei a profissão. Porque uma mulher bonita, prestativa, tinha que ter uma super profissão. E eu tinha razão, uma psicóloga de mão cheia e para ser quem é e ocupar o espaço que tem hoje, foi muito difícil. E por isso, fiz a entrevista com Tamara, com o maior prazer:




Eu nasci em São Paulo, mas meus pais vieram morar em Santos quando estava com 5 anos. Estou com 56 anos, então você pode ver que me sinto mais santista do que paulista. Contudo, minha vida inteira me senti como se estivesse sem um pedaço porque minha avó, meus tios e todos os meus primos moravam e ainda moram em São Paulo. Tirando minha avó que sempre estava conosco, o resto da família foi se separando e fui reencontrá-los no ano passado, exatamente 50 anos depois de nossa separação e para mim foi como se novamente estivesse completa, aquele carinho, aquela atenção que sempre tivemos , sendo que estávamos apenas os primos, pois em 50 anos muitos se foram, mas para mim pareceu que o tempo não havia passado e pude resgatar o companheirismo daqueles primos que nunca esqueci e agora os filhos dos primos, como se nunca os tivesse perdido. Foi um reencontro muito especial

A primeira vez que ajudei alguém foi minha avó, ela sofria de osteoporose e acabou quebrando o fêmur e andava amparada de muleta. Sempre que estava com ela, eu a conduzia segurando seu braço, lhe dando apoio e ela sempre dizia que nunca conseguia se sentir tão  segura com outra pessoa. Aquelas palavras sempre me incentivaram com a idéia de me tornar médica.Como deveria ter uns 6 ou 7 anos, ainda não sabia que existiam outras profissões que eram muito mais samaritanas.


Na verdade, tentei seguir essa profissão mais para agradar a minha mãe. O período que passei em palcos e emissoras de TV foi pequeno, principalmente quando cheguei à TV  bandeirantes para fazer algumas aparições, mas me desiludi completamente, existiam pessoas que eram maravilhosas e me recepcionaram de uma forma maravilhosa, mas a grande maioria achava que se encontrava acima dos seres humanos, kkkkkkk. Mas não foram as pessoas que mudaram meu desejo, na verdade o que realmente não aguentei foi ter que ficar repetindo e repetindo as cenas, várias e várias vezes, uma vez era o ensaio, depois começava de verdade, mas alguém se mexia, outro esquecia a fala, a luz não estava certa, seria melhor gravar de outro angulo. Meus Deus do céu! Aquilo não era pra mim. Houve uma passagem que foi especial. A maioria das leitoras nem vai saber a quem me refiro, mas quando era bem pequena, ainda morava em São Paulo minha família assistia uma novela que se chamava "O cheique de Agadir" e o malvadão era um ator que se chamava Henrique Martins que era o tal do cheique e que fazia um monte de maldades com a Yoná Magalhães que era a mocinha. Esse ator sempre fazia papel de bandido. Muito bem, lá estou esperando minha vez de gravar quando descubro que o diretor da novela era não mais nem menos que Enrique Martins, kkkkk. Me dei de cara com ele e gelei, como se estivesse em frente ao cheique malvadão kkkkkk. Toda vez que ia gravar com ele me preparava toda: pára de ser besta! É só um homem que um dia fez papel de vilão, ele não tem nada a ver com os personagens que interpretava, mas não tinha jeito, quando ele começava a falar lá do switcher eu estremecia e no entanto era uma pessoa maravilhosa, tranquilo, uma calma, uma educação, sempre pedia por favor para que fizessem a cena, mas o personagem acabava me impressionando.

Daí, quando percebi que não tinha a menor  paciência para aquela profissão, retornei aos pensamentos da minha infância e dessa vez sabendo que o serviço de enfermagem, apesar de muito hostilizado pela sociedade ,cheio de preconceitos que até hoje ainda continuam, decidi que seria a minha profissão e quanto mais estudava, mais amava e minhas colegas, na grande maioria, mulheres, também eram pessoas muito divertidas, a gente brincava demais, tirava sarro de tudo. Uma dessas colegas decidiu que deveríamos ser chamadas de prostis ( uma abreviação de prostituta, pois era como a maioria das pessoas viam a enfermeira), então tudo se chamava prosti, a prosti prova, o prosti trabalho, a prosti reunião e como existe até hoje, quem perdia a prova podia fazer uma prova substitutiva, então a nossa chamava prostitutiva kkkkkkk. A gente se divertia muito. Depois de formada, foi muito dificil arrumar emprego, porque naquela época os hospitais não contratavam um numero de enfermeiras como agora. Era basicamente uma enfermeira que cuidava de todo o hospital e se houvesse UTI ou centro obstétrico, então deveria ter uma enfermeira encarregada. O trabalho não era fácil, tudo ficava nas minhas mãos e corria o hospital , num sobe e desce, e vai atrás de médico e de medicação e da parte burocrática e das auxiliares que não tinham experiência tinha que ensinar  supervisionar, ou seja, fazia o trabalho de 5 ou 6 profissionais, mas era jovem com toda garra. Contudo, tinha idéia que não seria promissor para o futuro em relação à saúde e o salário, ohhhhh! Isto fazia parte, eu sabia que seria assim, mas o que eu não conseguia entender era o porquê das pessoas buscarem aquele tipo de profissão se só estavam ali pelo dinheiro. Ninguém estava interessado se o seu Antônio estava melhorando do seu quadro, nem que a filha da dona Maria veio de longe para visitar e lhe deu tanta alegria, não! Aquilo era coisa da minha cabeça, o que todos os profissionais queriam era ganhar dinheiro, como fazer para que o enfermo pudesse render alguns tostões a mais. Aquilo me deixava louca, mas o que me fez desistir de trabalhar dentro do hospital foram os óbitos. Era desconsolador ver a família muito mal informada saber que o pai havia morrido, o filho de alguém , a mãe. O desconsolo, a dor, o sofrimento me matavam. Até que um dia uma mulher que havia tentado engravidar várias e várias vezes, sendo que na maioria acabava abortando, chegou com o filho no colo pedindo ajuda,  mas pouco restava a se fazer e aquela mulher debruçada sobre o corpinho do bebê que ela tanto amava, sem um resto de vida, aquela imagem nunca me deixou , assim como tantas outras. A mãe com seu filhinho no colo e adivinha quem deveria chegar a ela e dizer que teria de entregar o corpo para  seguir a outros preparativos. Pois, é! Eu mesma! Tentei ser o mais solidária, o mais compreensiva, expliquei a necessidade de levar o corpinho, mas pra mim, aquilo foi tudo de mal que poderia fazer a uma mãe, me senti tão culpada de separar uma mãe tão sofrida daquele que durara alguns meses ao seu lado, foi como me sentir apunhalada, como se eu mesma estivesse enfiando uma faca no meu estômago, passei várias e várias vezes por aquelas imagens e me culpava, deveria ter deixado a criança um pouco mais no colo daquela mãe, ela nunca mais iria o ter aseu lado, eu era a pessoa mais horrivel da face da terra, separar uma mãe de um filho amado.;    Depois desse fato, nunca mais consegui fazer o serviço do modo que deveria, estava ausente, sem vontade, de alguma forma, estava protegendo meu emocional. Todos diziam, você não foi fita pra isso, é muito sensivel,aqui no hospital só tem miséria. Como havia descoberto que estava grávida, decidi parar, mas ficar em casa sabendo que existiam tantas pessoas que necessitavam do meu auxílio. Então fui para a parte teórica, mas isso demorou um pouco, aproveitei o nascimento do meu filho, babei com tudo que aprendia, meu segundo filho nasceu e depois que já estava crescidinho, decidi que deveria voltar, mas de um modo diferente. Isso não quer dizer que deixeide atuar no hospital, levava meus alunos para as aulas decampo e atuávamos juntos e sempre fui da bagunça e brincadeira, me dava muito bem com eles e sempre passei a idéia de que aquele senhor ali deitado poderia ser seu pai ou seu tio ou seu irmão , mas sempre senti muito amor vindo desses alunos e fico muito feliz quando encontro vez ou outra com algum deles.

Era professora de enfermagem, uma vez dava aula de anatomia, outra semi optica,outra nutrição, mas sempre em escolas técnicas de enfermagem. 


Meu marido tinha uma condição economica razoável, nessa época estava no final da faculdade de psicologia, pouco sabia do que estava acontecendo com o seu empreendimento até o dia em que chegou e disse que teria que fechar as portas e aí descobri a quantidade de dívidas e tudo mais. Eu tinha que trabalhar, ganhar dinheiro, imaginava que teria meu consult´rio, minhas coisas e isto nunca aconteceu, usava a sala de um psicologo aqui, outra ali, alugava horários, pedia pelo amor de Deus que me enviassem pacientes. Como era recém formada a própria faculdade enviava alguns pacientes, mas não havia jeito de cobrar, era 10% de uma consulta e desse por feliz, estava aprendendo. Consegui através de uma professora entrar para um curso de especialização em transtornos da ansiedade na USP e conheci vários profissionais. Vez que outra aparecia um paciente que me pagava o valor real de uma consulta e era assim que eu fazia pra manter meus filhos na escola particular, um mês pagava no dia certo, outro levava com a barriga, pedia uniforme usado para as mães dos mais velhos, pedia livros usados, às vezes tinha que apagar o livro inteiro, mas ia atrás, dava aula, fazia bolo pra fora e fui levando. Fomos diminuindo todos os gastos, não tinhamos carro, nao dava pra sair, viajar só em ´pensamento. Pedia uma coisa pra um, outra coisa pra outro, eu fazia as festas de aniverssário, salgados, doces, bolo, enfeites, era a cicerrone e também a animadora, passava madrugadas fazendo as coisas e no dia seguinte era a hora de limpar tudo. Eu me virava como podia, meu marido aos poucos pôde reabrir seu negócio, mas até hoje ainda saldamos algumas dividas.

Meus filhos são tudo, meu único tesouro, tudo o que faço sempre é pensando no bem estar deles e se tiver que ir à lua pra ajudar, eu vou! Certamente, eles cresceram vendo as nossas dificuldades e são pessoas que também agem dessa forma, trabalham ,ajudam dentro de casa seja economicamente, seja nos afazeres domésticos, nunca cheguei e disse, de agora em diante vai ser assim, não! As coisas foram acontecendo e fomos nos enquadrando e consigo perceber o quanto eles dão um retorno de tudo o que aprenderam nessa vida.

Se eu acho que valeu a pena! Completamente! Foram momentos de enorme turbulência, muitas vezes pensava, xi não vou conseguir e como num passe de mágica as coisas davam certo e se não vinha do jeito que a gente imaginava, aparecia de outro. Deus nunca me deixou nessa empreitada sozinha. 

Uma psicóloga(o) é muito mais que uma coleção de teorias, é necessário muita vivência. Quanto às mais jovens, eu diria pra procurarem ongs, instituições, locais repletos de pessoas com problemas sérios. Não queira resolver a vida de ninguém, a gente não resolve nem a nossa, o que dirá dos outros. O melhor a fazer é escutar, escute, escute com os ouvidos, escute com os olhos, escute com a pele, aprenda a escutar, esse é o primeiro passo. Minha professora contou a lenda de Epicuro que era um curandeiro do período grego. Ele participou de várias batalhas e numa delas se feriu gravemente, aquela ferida nunca fechou. Quando estava com seus pacientes e eles lhe diziam onde estava doendo, a intensidade da dor, ele podia sentir na sua ferida que doía da mesma forma. Ela nos explicou que os terapeutas são assim, cada um tem a sua ferida que por mais bem cuidada, não se fecha completamente e muitas vezes sangra e dói, mas é por ela que podemos entender a dor do outro.


O maior problema psicológico de hoje é a falta de fé. As pessoas não acreditam em si próprias, elas não acreditam que em cada ser humano existe uma energia, uma sabedoria que vai aparecer justamente na hora da necessidade. Se você não acredita, também não ode saber o que sua crença pode fazer por você. Não estou falando de uma forma religiosa, mas acreditar que Deus está em você, modifica tudo. Deus pode ser a beleza interior, Deus pode ser o seu amor, Deus pode ser a coragem, a felicidade, a perseverança e quem crê conquista. O que vejo hoje, quer seja em relação aos pacientes ou as pessoas à minha volta é que o sentimento que reina é o medo que gera insegurança, que gera temor, que gera pânico, que gera ansiedade, que gera depressão. As pessoas estão doentes, essa doença se chama medo e esse medo se alastra tanto emocional quanto fisicamente. Não conseguem respirar, ou seja, aquilo que te mantém vivo é feito de forma errada e quem gera isso é o medo. Perceba se nos momentos de ansiedade você consegue respirar. A gente prende a respiração, o oxigênio não é distribuído completamente, não chega de maneira eficaz, não faz a troca de gases como deveria. Você pode imaginar quantas doenças se desenvolvem a partir dessa pequena falha! Vejo tantas pessoas que passam pelo consultório com dificuldades e tento explicar que aquilo é uma dádiva, se souber compreender terá o amadurecimento para iniciar uma vida repleta de perspectivas, mas infelizmente, muitas vezes o medo impede que aquela pessoa vislumbre um mundo diferente.      


Na verdade, o que vejo dentro da clínica são as doenças que vão se cronificando, mas que começaram pelo medo. Transtornos de ansiedade em geral, transtorno do pânico, TOC, transtorno bipolar, depressão e ultimamente andam aparecendo os transtornos de personalidade que já se trata de uma condição patológica grave e muito difícil de se tornar consciente, porque não existe um tratamento específico, cada um vai descobrir como agir, o que fazer para controlar esse comportamento. Realmente difícil e ainda mais difícil de diagnosticar.

As tecnologias apareceram e continuam a aparecer para nos auxiliar de todas as formas, em todos os campos, sou a favor de tudo, mesmo sendo bem bronca em relação a essas maravilhas. Na psicologia não existem tantos artifícios tecnologicos, mas o Skipe está sendo um auxílio para o desenvolvimento de algumas sessões, muitas vezes se torna impossível o paciente ir ao consultório ou o terapeuta ir até o paciente. Contudo, como em tudo na vida, temos que saber dosar. Como falei em outra questão, o terapeuta tem que aprender a ler seu paciente e para isso se torna necessário muitas ferramentas perceptivas, os olhos ajudam, mas podem falhar. Quando estamos próximos ao paciente podemos sentir a energia de uma forma completamente diferente. Uma das coisas que acho imprescindíveis numa relação terapeuta - paciente é o toque. Abraçar aquela pessoa que está ali, muitas vezes em busca de um pouco de atenção, de uma troca. Num momento mais vulnerável poder segurar a mão , tocar em seus ombros e muitas vezes até fazer uma massagem, porque não! Acredito muito na cura pelas mãos, a enfermagem me mostrou isso. Dessa forma, o skipe se torna limitado, mas quando precisamos de ajuda, o melhor é que apareça do jeito que for.   
  

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